Foi um grupo de amigos que, um dia, ao falarem-me de Medjugorje me convidaram a visitar, em jeito de peregrinação, muito livremente. E uma vez que ando um pouco por todo o mundo com a máquina de filmar, aceitei o desafio para fazer um programa ‘Oitavo Dia’, a partir desse singular Santuário na Bósnia. Queria ser verdadeiro, primeiro comigo e depois com as pessoas a quem faria uma narrativa de um acontecimento, as aparições, um lugar de oração, um espaço lindíssimo onde se respira fé e vida.
Sabia que Medjugorje vinha nasequência de Fátima e Lurdes e perguntava-me o que iria lá fazer, quando uma das coisas mais regulares da minha agenda, nos últimos quarenta anos, tem sido nos dias 12 e 13 de Maio e Outubro, dirigir as transmissões de Fátima. Para além das visitas, que praticamente todas as semanas faço à Cova da Iria, para os mais diferentes trabalhos, que nunca deixam de ser peregrinação.
Lá fui, à palavra serena e profundamente livre e respeitadora de quem me tinha informado. Com um grupo de sacerdotes e leigos , em clima de retiro, a que eu acrescentava o tom da reportagem, o que não me impedia de viver um clima de oração.
Comecei por embeber o clima e a alma do peregrino. Sabia que não havia uma aprovação oficial da Igreja, mas também não existia qualquer interdição. Aspectos devocionais menos coincidentes com as vias com que costumo chegar a Deus, já não eram essenciais. Havia a luz, o silêncio, o tempo, o ambiente, a oração da multidão em paz, as longas horas de meditação e oração, a Eucaristia, o terço, a festa. E uma extrema beleza e qualidade na liturgia. E a montanha. Essa montanha sedutora, que subi com uma imensa alegria, mesmo carregado de máquinas e cansaços. Mas isso, para mim, é um sacrifício inscrito na minha concepção de subir à montanha de Deus. Não sei se é o meu regresso aos tempos da errância ou da humanidade nómada, que me sinto sublimado em descobrir novos espaços, ainda que sejam na subida serena de uma montanha.
Esta tem o sabor ao Monte, onde Jesus esteve com Pedro, Tiago e João e onde uma imensa paz nos visita, com o total desprendimento de tudo o que é efémero e secundário. É uma experiência de interioridade, oração, cansaço e beleza nas estações da Via-Sacra, com o olhar preso na última etapa, a da Ressurreição. E ver tantos e tantas que sobem ao lado, rezam, cantam, fazem silêncio, repousam, continuam, num apelo que não se sabe de onde vem, mas se percebe claramente que tem o tom materno de Maria, a Mãe de Jesus.
E experimentar uma imensa reconciliação interior no Sacramento da penitência, vendo de perto e de longe a vida do passado e do presente. É como visitar aquela piscina de Siloé e se sentir a cura das pequenas e grandes lepras, que a nós se apegam.
Não me perdi em pormenores de doutrina ou pastoral.
Voltei a Medjugorje alguns anos depois. E não alterei o meu sentir e vibrar com a multidão, como acontece em grandes Santuários. Passei por Aparecida, Tchestokova, Monserrate, Guadalupe e muitos outros. Nenhum pretende ser um tratado de teologia. Apesar de reconhecer que não é qualquer escola de espiritualidade que serve a Igreja e o homem de hoje.
Mas Medjugorje reúne um conjunto de factores, que propiciam um tempo interior forte, com a Virgem Maria no coração do povo.
Cónego António Rego
Paróquia Nossa Senhora de Fátima - Lisboa